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Olhe que não, shô Doutor! Olhe que não...

Olhe que não, shô Doutor! Olhe que não...

Gula

pedro, 20.03.07












Não vejo sempre. É às vezes, sem grande sistema ou método. E vejo porque vivo com a certeza que o Fernando Mendes vai, um dia, antes do Telejornal, ter um enfarte do miocárdio em pleno concurso. E, perdoem-me os puristas, mas eu acho que um enfarte do miocárdio entre cestas de chouriços e queijos e galhardetes de freguesias que acabam invariavelmente em “al” ou “eira”, é coisa com o seu interesse televisivo. Ontem vi. Como devem calcular, ainda não foi ontem que sucedeu tal espectáculo mediático. Mas, em compensação, vi pela primeira vez um concorrente preto. E, convém frisar, n’O Preço Certo nunca há concorrentes étnicos. Isto, claro, se não se considerar a extrema saloiice uma etnia. Extremamente simpático e incompreensível, o concorrente preto perdeu uma merda chamada vitogrill porque escolheu um 4 em vez dum 6. E fez 60 na roda. O gordo do Fernando Mendes é mas é um racista da merda. Já o vi a ajudar muita velha, que levam sistemas de Home Cinemas para casas de xisto na freguesia de não sei quê “al” ou “eira”. Um home cinema para se lixar todo com a humidade. Mas quando foi para dar um vitogrill ali para a Damaia, ‘tá quieto, ò mau. E eu, palavra de honra, nem detesto assim muito os gordos. Na minha infância, até aprendi algumas coisas interessantes com existências dessas. Sobretudo com um, que defendeu uma vez uma bolada dum grande do 9º ano com as fuças. E nós andávamos no 5º, caramba. Foi o herói da tarde. Não me lembro é do nome dele. Nem sei se tinha nome. Era o gordo, pronto. Foi esse gordo que, revelando uma sapiência muito particular, me ensinou que o Malteser que acabara de atravessar o chão do maior corredor da escola, ainda estava bom se, condição essencial, o assoprássemos com muita força e de olhos fechados. Muito Malteser me salvou este preceito. Dizia o gordo, “só sabe a pó e terra se quiseres, se acreditares nisso, Pedro”. E tinha razão. Também é verdade que esse gordo dizia, à boca cheia, que pão com tulicreme e frutas cristalizadas era muito bom. E ainda me lembro de, à pala das ideias dele, ter levado uma galheta porque fiz Cerelac com leite condensado cá em casa. De lamparinas precisou ele, enquanto andou a ganhar massa adiposa. Há quem defenda que uma boa palmada na altura certa nunca fez mal a ninguém. Eu defendo que sim. Se calhar, fazia apenas um pequeno reparo. Ou dois. Um casal de reparos. No caso do gordo, esta sentença popular ganharia eficácia extrema se se substituísse “boa palmada” por “sova de mangueira” e “na altura certa” por “sempre que pedir uma bolacha”. Se uma campainha pôs aqueles cães russos a salivar, uma sova de mangueira é coisa para pôr um potencial gordo na linha. Esse gordo em particular, à laia de justificação, dizia que era assim, “forte”, porque tinha um problema glandular. Mais que serem gordos, suarem no Outono e respirarem muito alto, enervam-me as desculpas. Glandular? Só se glandular fosse alguma marca de chocolate que se comia na altura. No supermercado perto de casa só havia Táxi, Raider e sempre a mesma caixa de Bombocas, mas o gordo morava perto dum hiper. Nunca se sabe o que por lá se vendia. Cada vez que vejo um, lembro-me desse gordo. São estas coisas que perduram. Defender um remate dum grande do 9º. Com as fuças. E também me lembrei dele há dias, quando li uma notícia sobre obesidade mórbida. Obesidade mórbida é, está à vista de todos, um nome simpático. Como se exige, pouco pesado e nada agressivo. Dantes, tínhamos gordos. Depois obesos. Depois obesos mórbidos. A seguir, às tantas, vamos ter obesos mórbidos “eh pá, quantos urinóis ocupa este gajo?”. Mas é inegável que um gordo dá sempre jeito. Para ir à baliza, claro. Para o cão do vizinho morder em alguém primeiro e nós pudermos fugir, como é óbvio. Mas também noutros contextos. Em acidentes de aviação, por exemplo. Se, como naquele filme com aquele gajo que fez o coiso, o avião cair na neve e der a fome aos passageiros, come-se o gordo. Além de ter mais alimento, também come mais. É a lógica de mercado. Churrasco no gordo. Se a gula é pecado capital, ao menos que sirva para se poderem comer gordos quando pessoas normais estão presas na neve. Mas comer sem depois ter chatices com a polícia e assim.

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