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Olhe que não, shô Doutor! Olhe que não...

Olhe que não, shô Doutor! Olhe que não...

Outra vez aquilo do Português de Sempre

pedro, 18.01.07



Já é então conhecida a dezena de nomes de onde vai sair o Maior Português de Sempre. De fora, comprovando que isto de não ter um grupo de pressão é a morte do artista, ficou o inventor da maior harmonia que o mundo já testemunhou, os já anterior e muito justamente vangloriados jaquinzinhos com arroz de tomate. O facto de não se saber quem raio inventou tal iguaria também pode ter pesado na altura de o nomear como Melhor Português de Sempre. Percebo que as pessoas, quando se trata de nomear, precisem de um nome. As pessoas precisam destas facilidades. Por isso, e só por isso, não me escandaliza que o pioneiro na arte de juntar jaquinzinhos a arroz de tomate tenha ficado arredado da luta. Apartada que foi a minha primeira preferência, passo para o meu segundo favorito. Aquele que, objectivamente, mais fez e, sobretudo isso, continua a fazer pelos portugueses. Por este prisma, apenas uma leitura é válida. Leve-se isto realmente a sério e, pura e simplesmente, apure-se quem nos deu mais feriados. Ora, seguindo uma ordem essencialmente genial dos dez finalistas, comece-se por D. Afonso Henriques. Ao foder Espanha, Afonso tornou-se o pai da pátria portuguesa. Supõe-se que Espanha será a mãe. Não é lá muito claro, mas deve ser isso. A irmã de Afonso, Sancha Henriques, é a tia da pátria portuguesa. O filho dela será o primo de Portugal e por aí fora. Isso vale o que vale. É verdade que, se não existisse país, não existiam feriados. É a sua, de Afonso, grande virtude, mas não chega. A sede por feriados cega-nos e não nos permite fazer essas desconstruções lógicas. É tudo muito simples e directo. Não há feriados? Então adeusinho, obrigadinho, saudinha, mas isto não é concurso para o teu bico, Afonso. Passe-se desde já para Álvaro Cunhal. Ajudou a que o vinte e cinco de Abril fosse um feriado e, uns belos anos antes, alguns camaradas proletários conseguiram sacar o primeiro de Maio. Com a boa vontade que me caracteriza, e juntando as duas semi-participações, vou considerar que nos deu um feriado. Nada mau, fossem todos assim, Álvaro. Porque a vida é cheia de ironias, segue-se-lhe o Salazar. Conquanto o já supradito vinte e cinco de Abril tenha, enfim, também alguma coisa de Salazar, o que há a reter da acção deste indivíduo é que, em quarenta anos a mandar vir, nem um feriado impulsionou por vontade própria. E isso é, numa palavra, francamente fodido. Foi um homem ruim e, li algures, ou sonhei, é-me igual e em termos de factualidade a segunda hipótese até é mais factível que a que lhe precede, que o senhor chegou a querer transformar o sábado numa segunda-feira. Era um indivíduo belzebútico. O próximo atleta dá pelo nome de Aristides de Sousa Mendes. Consta que o grande feito deste senhor foi passar vistos a Judeus. A Lista de Schindler era para ser sobre ele, mas “Mendes’s List” soava mal e isto, ao fim e ao cabo, é tudo fonética. E feriados, Aristides? Nem vê-los. A culpa não será só dele. O mínimo que os Judeus podiam ter feito era dar-nos um dos seus feriados. Mas já se sabe como essa gente é só unhas-de-fome e não dá nada a ninguém. Fernando Pessoa é o nome que se segue. Parece que se ajeitava com as rimas e tinha um bigode e amigos imaginários, com apelidos e tudo. A estátua dele tem a pena cruzada à homenzinho, é certo, mas aquilo é posição para a deixar dormente em pouco tempo. Não é sinal de grande inteligência. Toda a gente sabe que convém ir trocando, e ele, bem vistas as coisas, acaba por ter sempre a mesma perna cruzada. Mas, mais importante que tudo isso, Pessoa, ler até distrai, amigo, mas feriados dá para ir à praia a meio da semana. Lamento, Nando. Siga-se para o Infante D. Henrique, o mentor dos descobrimentos. Há quem diga que foi o pioneiro dessa beleza que é a globalização. A verdade é que não passava dum beato com um chapéu ridículo que mandava os outros andar de barco. Tinha medo que se pelava do escorbuto, por isso está explicado o facto de tresandar sempre a laranjas. Não nos deu feriados e andar de barco enjoa. Na melhor das hipóteses, é um concorrente chocho. Aproxima-se outro rei. Desta vez, o D. João II. Nos filmes, a sequela só excepcionalmente vence o original e com os reis deve ser igual. Diz que esta sequela do D. João era o príncipe perfeito e é lembrado por ter deixado a sua rubrica no tratado de Tordesilhas. Com isso, garantiu-nos o Brasil. A parte positiva disto é que, se não tivéssemos ficado com o Brasil naquela altura, hoje ninguém se entendia quando fosse à Telepizza. Porque, apesar de tudo, português do Brasil ainda se compreende melhor que castelhano, obrigado, João II. Mas, ainda assim, não é um feriado. E eu até sei dizer queijo e fiambre em castelhano. Jamón e queso. E eles devem perceber “mucha cebolla” e “mucho atuno, gracias”. Logo, não me serviste de muito. E eis que se chega ao Camões. Os Lusíadas deram-nos algum feriado? Não. Embora o dez de Junho, data da morte de Camões, seja feriado. Neste sentido, é complicado não encarar o “bater as botas” como o maior feito de Camões, relegando “Os Lusíadas” para um patamar de absurda secundariedade. Camões, não é nada de pessoal, mas, caraças, em vida, dás-nos um livro. E dos grossos, de poesias. Quando morres, dás-nos um feriado. É suposto valorizarmos o quê, Luís Vaz? Até tu compreendes, vá. Aproximemo-nos do Marquês de Pombal. É perto da estátua dele que se festejam as vitórias, portanto, deve ter sido uma figura importante na História do futebol português. Mas não gerou feriados. E acho que usava capachinho. Finalmente, o décimo sujeito. O Vasco da Gama. Descobriu o caminho marítimo para a Índia. Que, pasme-se, parece que era pelo mar. Ele há coisas que não lembram ao diabo, realmente. Não deu feriados a ninguém e o caril faz-me dor de cabeça. Estar nos “dez mais” já é exagero suficiente.

Por conseguinte, o que sobressai desta inatacável decomposição é o facto de nenhum dos dez finalistas se ter destacado grande coisa nessa arte de nos presentear com feriados. E a revolta é o único sentimento válido quando se torna óbvio que, fora dos nomeados, ficou um indivíduo que, em termos de feriados, arrasa com os dez finalistas todos juntos e multiplicados por um número não maior que três. Exactamente! Jesus! Português, natural de Belém, terra dos pastéis, e Messias de profissão, parece que passava as férias de verão na Nazaré. Só assim se percebe que muitas vezes se refiram a ele como “Jesus de Nazaré”. Eu lembro-me de chamarem Chico da Caparica a um amigo do meu pai, e era porque ele passava as férias na Costa. Pois bem, Jesus, nascido em Belém, veraneante na Nazaré, era filho de Maria e o seu padrasto respondia pelo nome de José. Mais nacional que isto é complicado e, à luz dos factos, Jesus foi inequivocamente o melhor português de sempre. Repare-se só nesta categoria a arranjar feriados. Deixa-nos um feriado porque nasceu. Deixa-nos um feriado porque o mataram na cruz. Deixa-nos mais um feriado porque faltam não sei quantos dias para essa altura em que o crucificaram. Mas há mais! Há mais. Para além disso, Jesus conseguiu ainda, e se isto não é revelador de grandeza, eu não sei o que será, fomentar alguns feriados que nunca, mas nunca mesmo, calham ao fim-de-semana. Isto é absolutamente magnânimo! Isto sim, capta a essência que se exige a um feriado. O Carnaval é sempre a uma terça e a sexta-feira santa é sempre num dia de semana que agora não me lembra. Mas sei que não é ao fim-de-semana. Há um outro feriado, por causa do pai biológico de Jesus, que é sempre a uma quinta-feira algures no Verão. Sim, porque, a juntar aos feriados de Jesus, ainda há uma série de feriados que devemos agradecer aos seus amigos e família. O quinze de Agosto e o oito de Dezembro, por causa da mãe de Jesus, e o primeiro de Novembro, por causa dos seus amigos de sempre, os santos. Isto é que é ser grande. Isto é que ser melhor. A única coisa que se lhe pode apontar, porque Jesus, como todos os grandes e melhores também teve falhas, foi o de ter ressuscitado a um domingo. Agora a Páscoa é sempre nesse dia e é um feriado desperdiçado. É pena. E com uma segunda-feira ali tão perto, Jesus. Tão perto, chiça.

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